segunda-feira, 6 de julho de 2020

LOUCA DE LUTO

A cada copo uma lembrança, a cada giro no salão a certeza que ele nunca mais.

O primeiro gole foi de negação.

Mas como nunca mais? Como se mesmo agora engolindo o orgulho a goles de cerveja ele ainda era o infernal centro de meus devaneios? Além disso, nunca mais é muito tempo. E o ditado já avisa que nunca se deve dizer nunca. Porra é melhor outra roda pra essa convicção descer na minha mente.

Eu nego que tenha perdido a cabeça. Na verdade eu estava lá inteira e plena vivendo algo que eu sabia era passageiro. Não é porque liguei, mandei mensagens, áudios, fotos, vídeos e presentes que eu tenha sido invasiva. Prefiro me entender como obstinada, convicta, uma mulher fortemente apaixonada se entregando ao amor da vida dela. Não tenho culpa se também era o amor dela, o marido dela, o pai dos filhos dela. Não tenho culpa se havia uma vida deles.

O segundo gole foi de raiva.

Como não gostou? Como assim sou louca? A verdade é que ele gostou sim, ficou com medo, mas gostou. Qualquer um gosta de atenção, demonstração verdadeira de afeto genuíno. Gritar comigo, me mandar ir embora, jogar meu sapato pra fora foi demais. A vontade é de entrar lá agora e meter a mão na cara dele, da uma joelhada dessas que homem nenhum consegue levantar, quebrar todos os porta-retratos daquela casa. Fazer ele parar de bancar o santo nessa porra.

Sim, eu estou com raiva! Furiosa. Pronta pra fazer ele pagar o que me deve. Eu me entreguei, mergulhei no ar sem pára-quedas e só agora ele diz que é demais. Não sou destemperada, sou intensa. Vivo minhas emoções de forma verdadeira e sincera, não fico me escondendo por traz de mascaras. EU NÃO SOU LOUCA! Ela tem culpa nisso. Sei bem que ela é passado, uma amarra, um embuste na vida dele, é fácil ver isso. Que ódio dessa sua culpinha suja por causa dela.

O terceiro gole foi de negociação.

Pensa bem se isso pode ser considerado o fim? Será que consegue mesmo manter essa sua ultima palavra? Duvido. Ele gosta de mim, tem que admiti. Se não gostasse de tudo isso, não teria aceitado os presentes, pedido mais vídeos, ouvido todos os áudios, estimulados as fotos, respondido as mensagens, atendido as ligações. O que ele esta fazendo agora é covardia, escondendo de se mesmo que tudo isso que vivemos tem importância. Não entendo esse medo de ser feliz.

Tudo que eu quero é que ele aceite essa troca. Não há nada de errado em querer que ele pense bem antes de fazer essa escolha. Depois de comparar eu e ela certamente vai entender que sou seu destino. O que eu sinto, a forma como me entrego sem nada pedir é a forma mais pura verdade e forte de amor. Se ele pensar bem não fica com ela. Ele ficou todos esses anos ao lado dela e ainda dá suas escapadinhas porque ela não o satisfaz. Os filhos só servem pra prender. Aposto que ela vive reclamando, eu ao contrario sou bem resolvida, amorosa, fogosa e vou te levar a loucura. Que raiva dessa sua pena dela. Isso só pode ser pena. A história de vocês já era, hora de coisa nova. Acredita.

O quarto gole foi de tristeza.

Como posso ter me entregado tanto assim? Como controlar essa vontade de chorar? Estou sozinha. Sozinha nessa vertiginosa loucura de você. Segui na sua direção sem proteção, sem medir os riscos. É uma vergonha minha insensatez, achar que as migalhas que me dava apontavam um caminho de salvação da solidão em que me coloquei. Só de saber que não haverá nós sinto um nó na garganta. Os planos que fiz foram saindo com maquiagem, unhas postiças e o salto alto que já apertava.

Estou triste. Foi preciso tudo isso pra ver a loucura que escolhi viver sozinha. A grama do vizinho é verde porque foi regada, eu queria deitar nessa grama pulando o muro, invadindo a casa. Ele escolheu ela. Ela foi a escolha dele. Eles tem uma história, uma família, um passado e um futuro. E eu invejando ela, desprezando o que tinham porque queria tudo pra mim. Quero o pote de sorvete, a panela de brigadeiro e o filme romântico brega pra me consolar. Mas agradeço as amigas pelo balada bar também.

A quita rodada foi de aceitação.

Admito fiz a louca! Passei dos limites por muito tempo e dei motivos pra aquele grito de basta. Enchi o copo de cada coisa que fiz nesses meses e a gota d’água foi essa chegada inesperada. Chegar assim na casa dele de Sobretudo e nada de roupa. Porra eu sou louca. E se ela chega, nos pega na casa, me vê lá na farra? Estava ferrada. Destruía uma família por uma boa pegada. Esquece, volta e ajusta. É nunca mais com certeza!